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Eusébio +10: Ser ou não ser, já o Guilherme Agita-a-pêra perguntou...

segunda-feira, 19 de junho de 2006

Ser ou não ser, já o Guilherme Agita-a-pêra perguntou...

Hoje tive uma epifania: o Brasil é o Benfica dos Mundiais. Vejamos.
Brasil ganha 2-0 à Austrália. Têm mais posse de bola, mais remates, controlam o jogo e, sobretudo, marcam mais golos que os australianos. Conclusão da imprensa pelo mundo fora: Brasil quanto-baste, vence mas não convence, exibicão cinzenta, ah-e-tal-mas-a-Austrália-ainda-fez-dois-remates-e-quase-que-ia-marcando. A Alemanha ganha 1-0, no último minuto, a jogar contra dez, a uma seleccão polaca que é provavelmente a pior desde que o futebol foi inventado, e a imprensa conclui: a nova Alemanha de sempre, persistência alemã, o prémio de não desistir, a conviccão dos vencedores.
O Benfica ganha 1-0 ao Estrela da Amadora (não interessa, isto agora é um exemplo), com mais remates, mais posse de bola e mais golos, obviamente, que o adversário. Imprensa: paupérrima exibicão, Benfica ganha à tangente, quase-empate na Luz, Benfica à beira do abismo, fantasmas na Luz, queimem o treinador que não percebe nada disto. Os bimbos ganha 1-0 ao Salgueiros: sólidos e eficazes, vitória à campeão, vence e convence, grande vitória do treinador que gosta de jogar com dois defesas e três quartos com vista para o mar. Os lagartos ganham 1-0 à Naval: forte e consistente; ataque mortífero; atitude vencedora, grande novo-treinador que põe ordem nas tropas.
É um facto: para os ranhosos, sensacão mais orgásmica do que desancar na exibicão vermelha ou canarinha é inimaginável. O que é preciso é bater nos bons. Porque eles sabem que nunca serão bons, portanto a única esperanca que lhes resta é ver se os gigantes num acaso escorregam para, com eles transientemente ao nível do chão, os anões-mentais se poderem sentir à altura. Desenvolvendo.
O Real Madrid sempre foi um clube adorado em todo o lado. Até que um presidente com visão da coisa resolveu dizer que aquilo ia passar a ser uma equipa galáctica, e comprou todos os anos uma estrela (independentemente dos tiros no pé que algumas "estrelas" foram - isso é outra história): a partir desse dia, o Real passou a ser um alvo a abater. Galácticos? Era o que faltava, virem para aqui estes montes de talento feitos gajos a armar-se aos carapaus de corrida só porque uma unha pedal deles joga mais futebol que a minha equipa toda junta! Todas as equipas do Mundo queriam bater no Real, todos os comentadores exultavam quando o Real perdia, todos lhe batiam quando ganhava só por 3-0. Ganhar ao Real Madrid passou a ser o sonho de vida de muito boa gente. Ou seja, os medíocres não suportam ver gente com talento à frente, e necessitam de os aniquilar a todo o custo. Preferem encurtar a escala para ficar mais perto do topo do que trabalharem para a subir. Por isso odeiam quem tem talento, capacidade técnica e imaginacão (Benfica, Brasil, Itália, Argentina, Franca) e sempre conseguem valorizar os brutamontes (os panzers alemães, os competitivos americanos, os velozes sul-coreanos, etc, etc, etc.). Mais ou menos a mesma coisa que dizer: como nunca serei Picasso, mais vale dizer que prefiro aqui o trolha que pinta as paredes.
É por isso que cada vez que o Benfica, ou uma equipa com espírito de originalidade e com talento para a ter, marca um golo aos embrutecidos, aquilo é muito mais que um golo. É um grito de liberdade dos que são mais que os demais, é um murro no estômago daqueles que acham que a única hipótese que têm de conseguir qualquer coisa é destruindo a coisa para que os outros nunca a consigam. É um acto de vitória: os bons, the good guys, vibram com as suas vitórias. Os reles, nunca nada hão-de ter que não sejam as ocasionais derrotas dos adversários. É por isso que ser do Benfica é mais que ser de um clube. É ser. E viva o Mantorras.

3 comentários:

Diogo disse...

Boa analise Nuno. Eu adicionava mais um exemplo, que pouco tem a ver com equipas mas com qualidade managerial: o Mourinho. Insultar o Mourinho, o seu estilo de futebol, a sua maneira de estar no futebol, o desvalorizar os seus feitos, so' porque ele mostrou a treinadores empertigados o que e' futebol moderno. O que o Cruyff fez com a Holanda e com o Barcelona (o futebol total), foi renovado pelo Mourinho. Nao foi pelo Wenger nem pelo Ferguson, que terao os seus creditos em titulos que conquistaram. Mas ser campeao europeu com uma equipa portuguesa nao imaginava a muita gente, por isso ele, o Mourinho, tera' algo mais que os anteriores.

Diogo disse...

E ser bom nao esta' ao alcance de todos. Ate' ao dia em que os alemaes "produzam" um Messi, os ingleses "inventem" um Ronaldinho, ou os coreanos "desenhem" um Cristiano Ronaldo (temos que dar credito ao jogador portugues, que tem crescido consideravelmente desde os tempos do Pacheco e afins), todos quererao denegrir a qualidade que eles jamais atingirao. E todos passam por imprensa e treinadores. Como exemplo, o treinador da Arabia Saudita teve o desplante de dizer que a Ucrania era uma equipa fraca. Estamos com 72 minutos no jogo e estao a comer 3 e nao me admirava que comessem mais 3. So' lhes fazia bem. Porque humildade tambem e' um dos atributos dos bons.

Nuno disse...

Por acaso era para ter acrescentado o Chelsea. Em vez de se agradecer o facto de o russo injectar dinheiro, ataca-se a equipa. Hoje em dia, ataca-se tudo o que tem sucesso - porque o que tem sucesso mostra duas coisas: que é possível ter sucesso, se se trabalhar para isso, e que os rascas nunca deixarão de ser rascas, mesmo que ganhem às vezes aos outros rascas.